Qual é a causa da violência no Haiti e como ela afeta os católicos do país? 5l3f24
Santa Missa na paróquia do Sagrado Coração no Haiti. | Crédito: ACN.
Por Andrés Henríquez
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25 de mar de 2024 às 13:56
Desde o início de março, a situação política e social no Haiti piorou consideravelmente. Lá, os católicos vivem a sua fé de uma forma “extremamente heroica”, superando todo tipo de dificuldades, segundo María Lozano, assessora de imprensa da fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN).
O Haiti – considerado pelo Banco Mundial o país mais pobre da América Latina e do Caribe – tem se envolvido em uma espiral de violência incontrolável, desencadeada pela atuação livre de gangues criminosas que controlam cerca de 80% do território de Porto Príncipe, a capital do país. A polícia haitiana, até hoje, não conseguiu controlar a situação.
Padres, freiras e leigos foram sequestrados em diversas ocasiões por estes grupos criminosos, alguns dos quais ainda hoje continuam em cativeiro.
A Conferência Episcopal local falou várias vezes sobre a situação, manifestando a sua proximidade aos mais vulneráveis e pedindo que sejam feitos acordos para pôr fim aos abusos.
O papa Francisco falou em diversas ocasiões sobre a difícil realidade haitiana ao longo dos últimos anos, pedindo que se trabalhe pela paz e pelo bem-estar dos mais vulneráveis, além de solicitar a libertação dos religiosos sequestrados.
Uma mulher em oração diante da cruz ainda de pé da Catedral de Porto Príncipe. Crédito: ACN.
“Convido todos os atores políticos e sociais a abandonar qualquer interesse particulare e se empenhar-se num espírito de solidariedade na busca do bem comum, apoiando uma transição pacífica para um país que, com a ajuda da comunidade internacional, seja dotado de sólidas instituições capazes de restabelecer a ordem e a tranquilidade entre os seus cidadãos”, exortou o papa, no dia 17 de março de 2024, na conclusão da oração do Ângelus.
Mas como o Haiti atingiu um estado de anarquia tão grave? Foi por causa de uma sucessão de acontecimentos que, durante pelo menos três anos, perturbaram a paz e a convivência cidadã:
2021: Um assassinato e um terremoto
Na madrugada de 7 de julho de 2021, um grupo de homens assassinou o então presidente haitiano Jovenel Moïse. Durante o seu mandato, foram frequentes os motins e protestos antigovernamentais.
Os bispos haitianos condenaram o crime e pediram a superação dos interesses de grupo, a deposição de armas e a escolha da vida e da paz em vez da violência e do ódio.
No dia 20 de julho, o primeiro-ministro Ariel Henry assumiu a presidência interina do Haiti, cargo que ainda ocupa, apesar dos constantes pronunciamentos da Igreja local, de entregar o poder a “líderes legítimos eleitos pelo povo através de eleições”.
Em 11 de setembro de 2021, Henry assinou um acordo para formar um governo de transição acordado com os partidos políticos da oposição. Nesse momento, foi acordada a realização de eleições presidenciais no início de 2022.
Nesse mesmo ano, em 14 de agosto, um terremoto de 7,2 graus na escala Richter abalou o país caribenho, devastando ainda mais a sua precária economia e aprofundando a crise política e social. Houve 2.248 mortes e quase 13 mil feridos.
2022 e 2023: A crise piora. Intervenção militar internacional no Haiti
Ao longo da maior parte de 2022, os confrontos entre gangues criminosas tornaram-se cada vez mais comuns, especialmente na capital, e centenas de pessoas foram assassinadas nas ruas haitianas.
Os preços dos combustíveis subiram e o governo solicitou pela primeira vez o envio de forças militares internacionais para controlar a situação
Em 7 de fevereiro de 2022, data em que terminou o mandato constitucional do presidente Moïse, Henry recusou-se a renunciar e prometeu estabelecer uma nova data para as eleições presidenciais num futuro próximo.
Já em 2023, o Quênia prometeu enviar 1 mil agentes policiais ao país, no âmbito de um acordo de segurança com o Grupo de Amigos do Haiti. Em outubro, um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) mostrou que a violência no país aumentou consideravelmente desde 2022.
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Também em outubro de 2023, a ONU aprovou o envio (por um ano) de uma força multinacional para ajudar a polícia haitiana, depois do pedido feito pelo próprio presidente Henry e imediatamente apoiado pelo secretário-geral António Guterres em 2022.
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Até agora, esta assistência não se concretizou, entre outras coisas por causa das dúvidas de várias nações sobre a legitimidade do governo inconstitucional de Henry.
2024: A violência se espalha no Haiti
No dia 1º de março, Henry assinou o acordo de segurança em Nairóbi, no Quênia, para auxiliar a polícia haitiana. Em 28 de fevereiro, o primeiro-ministro das Bahamas disse que Henry se comprometeu a fazer as eleições antes de 31 de agosto de 2025.
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À medida que cresciam os protestos pedindo a renúncia de Henry, em 2 de março, gangues criminosas invadiram as duas maiores prisões do Haiti, libertando aproximadamente 5,4 mil prisioneiros. O governo declarou estado de emergência e toque de recolher por um mês.
Mais de 362 mil pessoas foram forçadas a abandonar as suas casas, das quais 180 mil são crianças, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM) da ONU. Nas últimas semanas, a violência atingiu novos níveis e grupos criminosos mataram dezenas de pessoas inocentes.
Em 12 de março, Henry anunciou — de Porto Rico — que renunciaria ao cargo quando um “conselho presidencial de transição e a nomeação de um primeiro-ministro interino” fossem estabelecidos no país. Ele também disse que “o Haiti precisa de paz, estabilidade e desenvolvimento duradouro”.
Como a violência afeta os católicos no Haiti?
Em entrevista à ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, a assessora de imprensa da ACN disse que a situação política no país “é desastrosa desde 2021, com o assassinato do presidente”. Depois desse acontecimento, disse Lozano, o país ficou “à deriva”. Segundo ela, os cristãos locais vivem diariamente com um “medo terrível”.
“Apesar de tudo isto, o testemunho que nos chega é que este povo haitiano continua a fazer todo o possível para viver muito perto de sua fé”, acrescentou.
“É uma situação de tremendo sofrimento, mas também de tremenda fé e de um testemunho maravilhoso de um povo haitiano que, apesar de tudo que vê, não está desmoronando”, disse Lozano.
Uma freira que trabalha no Haiti – cujo nome ela não quis revelar por razões de segurança – disse à ACI Prensa que “o panorama é desolador” e que a maioria dos haitianos “estão como sequestrados em suas casas”.
“O haitiano tem uma capacidade incrível de sofrimento e uma capacidade única de resistência”, disse ela.
A freira disse que “as pessoas têm medo de sair”, porque em cada bairro “há um grupo armado”. Contudo, disse que para ela “é muito edificante” poder testemunhar como os haitianos guardam e mantêm a sua fé, depositando toda a sua confiança em Deus.
“No meio das dificuldades eles invocam Deus. Têm grande capacidade de enfrentar as adversidades da vida e de transformar a sua dor em força motriz para se superarem e emergirem mais fortes. Eles vivem na alegria e são os promotores – às vezes involuntariamente – do seu próprio destino”, disse a freira espanhola.
Para ela, esta é uma experiência transformadora que fortalece a sua fé e o seu estado de vida como mulher consagrada. “Para chegar à luz é preciso ar pela cruz”, disse. Para ela, também é irável a tenacidade dos católicos que, apesar de tudo, quiseram frequentar as suas paróquias para os serviços religiosos.
Lozan comentou que uma das prioridades da ACN é fazer todo o possível “para que os cristãos não se sintam sozinhos”. Por isso, organizam diversos projetos de apoio como retiros e cursos de formação, especialmente para jovens.
A fundação pontifícia também apoiou as diversas rádios diocesanas do Haiti, “para que sejam a voz da Igreja nos lugares mais distantes”. Na área elétrica, a ACN tem fornecido painéis solares a diversos locais, para ajudar a aliviar a grande carência de serviços públicos.
A fundação também se dedica a apoiar o clero haitiano, para que tenha um respiro e seja um pouco mais fácil continuar sendo um apoio para a população diante de tanto sofrimento.
Lozano considera de grande importância o papel dos bispos do país, que constantemente pedem concórdia. Nesse sentido, disse que a ACN se juntou ao apelo dos bispos do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), que fez na sexta-feira (22), um Dia Continental de Oração, para pedir a Deus s pela paz na nação caribenha.
Finalmente, a freira no Haiti também falou dos esforços da Igreja local. “Sentimos em nome do arcebispo e de todos os bispos declarações que procuram manter a esperança em meio à dor”.
“A oração move os corações e agradeço, em nome de todos os religiosos e de todas as pessoas que estão aqui, por esta oração muito especial pelo Haiti”, concluiu.
Andrés Henríquez é um jornalista venezuelano especializado em religião e política. Mais de 5 anos de experiência em meios bilingues. É membro da Federação Regnum Christi.
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